Encerrada a greve dos controladores de vôo
Da Folha de S.Paulo, hoje:
"Os controladores de vôo se amotinaram ontem, paralisando o espaço aéreo brasileiro e obrigando o governo federal a ceder a suas exigências por escrito para voltar ao trabalho.
O motim, iniciado no Cindacta-1, em Brasília, durou cinco horas e 20 minutos, espalhando-se pelo país e suspendendo praticamente todas as decolagens no país. [47 aeroportos foram paralisados]
Pego de surpresa, o governo formou um gabinete de crise e se reuniu por telefone com o presidente Lula -que estava em vôo para Washington e vetou decisão da Aeronáutica de prender os sargentos amotinados. O presidente interino, José Alencar, foi chamado de Minas Gerais para coordenar a crise em Brasília. O ministro Paulo Bernardo (Planejamento) e a secretária-executiva da Casa Civil, Erenice Guerra, foram negociar pessoalmente com os controladores no Cindacta-1 às 22h30.
Uma hora e meia depois, os dois assinaram um compromisso no qual o governo promete rever punições já aplicadas e não realizar retaliações pelo motim de ontem. Além disso se comprometem a retomar na terça-feira, 3 de abril, duas negociações: a de uma "solução civil" para o setor e a gratificação salarial."
O Motim
"O estopim do protesto foi a transferência do sargento Edleuzo Cavalcanti do Cindacta-1 para um pequeno destacamento em Santa Maria (Rio Grande do Sul) -havia temor de mais transferências ou prisões. Ele é diretor de mobilização da Associação Brasileira de Controladores de Tráfego Aéreo e foi um dos alvos do Inquérito Policial Militar que apurou a operação-padrão de 2006.
A data coincide com os seis meses do acidente do vôo 1907 da Gol, que deflagrou a crise.
O país tem cerca de 2.300 controladores civis e militares vinculados à Aeronáutica e que atuam em torres de aeroporto, área de aproximação e controle de área (as três divisões do tráfego), além da Defesa Aérea. Cerca de 80% do total é militar e são proibidos pela Constituição de realizar greve.
O protesto começou durante o dia como aquartelamento voluntário e greve de fome e a paralisação começou de fato às 18h40 no Cindacta-1 em Brasília, centro responsável pelo Centro-Oeste e Sudeste, ou quase 75% do tráfego aéreo nacional.
Apenas esse centro parado engessa o tráfego nacional. O Cindacta-4, em Manaus, aderiu depois e, em seguida, o Cindacta-2 (Curitiba) se uniu ao motim. O status do Cindacta-3 (Recife) permanecia incerto.
Em Brasília, mais de 200 sargentos estavam amotinados dentro e nos cômodos em volta da sala de controle principal.
Antes de iniciar as negociações com Paulo Bernardo, houve dois momentos de tensão. Primeiro, Saito sugeriu dar voz de prisão aos amotinados, e a notícia se espalhou. Lula vetou, falando do avião presidencial.
Em outro momento, a FAB tentou resolver a questão internamente. O chefe do Cindacta-1, coronel Carlos Vuyk de Aquino, chamou um grupo de 16 controladores mais antigos para conversar. Porém o grupo rejeitou a iniciativa.
O protesto começou no início do dia, com a circulação de um manifesto anunciando a intenção de aquartelamento voluntário e uma greve de fome. Quatro reivindicações foram listadas: fim das retaliações, gratificação salarial, desmilitarização do setor e a participação de controladores numa comissão para acompanhar o processo."
Governo divulgou nota oficial cedendo às pressões dos controladores de vôo
Do Blog do Noblat:
"O ministro de Estado do Planejamento, Orçamento e Gestão e a Secretária Executica da Casa Civil da presidência da República comprometem-se com os seguintes ítens de negociação a respeito do controle do tráfego aéreo:
1. O governo federal fará a revisão dos atos disciplinares militares, tais como transferências, afastamentos e outros, envolvendo representantes de associações de controladores de tráfego aéreo ocorridos nos últimos seis meses, assim como assegura que não serão praticadas punições em decorrência da manifestação ocorrida no dia 30/3/2007;
2. Abrir um canal permanente de negociação com representantes, inclusive de controladores militares, para o aprimoramento do tráfego aéreo brasileiro, tendo como referência de início dos trabalhos a implantação gradual de uma solução civil, a partir de terça-feira, 3 de abril de 2007;
3. Abrir um canal de negociação sobre remuneração dos controladores civis e militares a partir de terça-feira 3 de abril de 2007.
Paulo Bernardo e Erenice Guerra."
Nota da coluna Painel da Folha de S.Paulo, hoje:
"Catarse. Com o colapso no aeroporto de Brasília, os passageiros impedidos de embarcar entoaram um "Fora, Lula" no início da noite de ontem."
Voar passou a ser uma opção de alto risco
De Eliane Cantanhêde na Folha de S.Paulo, hoje:
Os controladores de vôo, na maioria sargentos, se auto-aquartelam, param os aeroportos da capital da República e de todo o país, até fechar o espaço aéreo nacional. E ganham a guerra. Suas reivindicações serão atendidas. O que eles demonstraram de força e articulação o governo mostrou de fraqueza e desarticulação.
Foi a história de um apagão anunciado, mas o governo não se preparou. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva estava nos EUA, o vice José Alencar não tem idéia do que fazer, o ministro da Defesa, Waldir Pires, só fala no "estado democrático de direito" e o comandante da Aeronáutica, brigadeiro Juniti Saito, parece cego em tiroteio. Quem assumiu? O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo! Não é sério.
A Defesa, a Aeronáutica, a Infraero e os controladores trocam acusações há meses, enquanto as companhias aéreas tiram uma "casquinha". Lula não viu, não sabia, mas determinou uma solução "urgente".
"Urgente", para Pires, é seguir fazendo reuniões que não dão em nada, para entregar um relatório daqui a uns 15 dias sobre o que todo mundo sabe: o sistema e seus agentes estão completamente fora de controle. Voar passou a ser uma opção de alto risco.
O sistema era considerado equivalente aos melhores do mundo, mais de 95% dos vôos das principais companhias saíam no horário e, apesar da quebra da Varig e do aumento expressivo do número de passageiros, tudo parecia em paz.
Depois da queda do Boeing da Gol, em 29 de setembro, tudo mudou. A versão de que o sistema estava podre e ruiu não resiste ao óbvio. Um sistema assim não implode da noite para o dia. O mais provável é que esteja sendo explodido.
O que ocorreu foi uma seqüência de erros do governo. Os controladores fizeram no fim do ano uma operação-padrão que praticamente parou os aeroportos, Pires atropelou a hierarquia militar para negociar com sargentos insubordinados, e Lula jogou o ministro do Trabalho na negociação.
Uma questão de disciplina foi tratada como sindical. Pior: sem atender as reivindicações, algumas delas justas. O governo errou na forma e no conteúdo: minou a autoridade do comando militar e não ganhou a boa vontade dos manifestantes.
O efeito foi em cascata. A Aeronáutica ficou perdida, os controladores se organizaram, as companhias passaram a camuflar cancelamentos convenientes e começou o lado mais preocupante de todo o caos: súbitas e praticamente inéditas panes.
Foram duas em dezembro, uma no rádio do Cindacta-1, de Brasília, e outra seis dias depois no radar do Cindacta-2, de Curitiba. Em março, foram mais duas, uma novamente em Brasília e outra quatro dias depois, em Curitiba. Não há um só oficial da Aeronáutica que não desconfie de ato político, mas a tão famosa inteligência militar não chega a lugar nenhum.
O governo está desgovernado, os controladores estão descontrolados, e a população, à mercê de uma situação que, definitivamente, não é coisa de país sério. Na terça-feira, começa a desmilitarização do setor. Mas a crise continua."
Para Lula, radicalização agravaria crise
De Kennedy Alencar na Folha de S.Paulo, hoje:
O presidente Lula recebeu um telefonema por volta das 20h40 de ontem em pleno vôo para Washington, onde se reunirá hoje com o colega dos EUA, George W. Bush.
A decisão de falar com Lula foi tomada pelo "gabinete de crise" após o agravamento da greve dos controladores do vôo. O chefe-de-gabinete Gilberto Carvalho fez a Lula um relato da situação -suspensão de vôos, aeroportos cheios e decisão do comandante da Aeronáutica, brigadeiro Juniti Saito, de dar voz de prisão aos controladores de vôo militares.
Integrantes do "gabinete de crise" acreditavam que poderia haver dificuldade para substituir os presos e, portanto, um agravamento do problema.
Lula avaliou que a radicalização do governo agravaria o problema e pediu que se tentasse negociação. Designou-se, então, o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, como negociador."
CONTROLADORES SÃO OS CAMINHONEIROS DE ALLENDE
De Paulo Henrique Amorim no Conversa Afiada:
". Uma greve nacional da Associação dos Donos de Caminhões financiada pela CIA ajudou a derrubar o presidente Salvador Allende, do Chile, em 1973.
. O objetivo do “paro” dos caminhoneiros era exatamente o dos controladores: desorganizar a produção.
. Chave da operação dos caminhoneiros chilenos era derrubar os Ministros da Defesa, Carlos Prats e Orlando Leteleier, com o que se acabava por desmoralizar o Presidente da República.
. No Chile de Allende, havia um mínimo de pluralidade na imprensa – uma parte da imprensa apoiava o presidente eleito pelo povo.
. Aqui, os controladores de vôo já há algum tempo aplicam a chantagem de “parar” o país. . Hoje, nesta sexta-feira, conseguiram.
. Aqui, os controladores de vôos contam com o apoio de 90% da imprensa escrita e uma parte da imprensa de televisão.
. E têm o mesmo objetivo dos colegas chilenos: derrubar o Presidente da República.
. A reivindicação dos controladores de vôos não é uma questão sindical ou militar - é política e tem como alvo a estabilidade das instituições democráticas.
. O objetivo, aqui, também, é desestabilizar o Ministro da Defesa, Waldir Pires, que já conta com uma resistência razoável das Forças Armadas, que não se esquecem que ele serviu ao Presidente João Goulart.
. A outra parte da operação consiste em provocar a queda do Presidente da República pela mão da imprensa e de uma CPI que, agora, contou com a ajuda providencial de um Ministro do Supremo Tribunal Federal.
. No Chile, como aqui, o “paro” dos controladores tem a função de jogar a classe média contra o Governo. Quem anda de avião é a classe média.
. O “paro” dos nossos caminhoneiros se deu imediatamente depois que o Presidente da República decolou para se encontrar, neste sábado, com o Presidente Bush.
. É obvio que a intenção é esvaziar e constranger o Presidente da República.
. Para isso, de novo, os caminhoneiros contarão com o apoio da imprensa, que saberá explorar o “apagão aéreo”, como forma de embaraçar o Presidente da República num momento em que trata de importantes negociações com o Presidente da nação mais poderosa do mundo.
. Em 1981, o presidente Ronald Reagan enfrentou uma greve de controladores de vôo com a demissão de 11 mil de 13 mil controladores grevistas.
. Aqui, o governo trabalhista já foi longe demais na tentativa de negociar com os controladores.
. Os controladores demonstraram que têm um poder de chantagem ilimitado.
. Só o uso da lei resolverá o problema.
. A hora de negociar passou.
. Os nossos caminhoneiros estão na ilegalidade e no golpe."
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