Agaciel Maia, diretor-geral do Senado, é acusado de comprar casa de R$ 5 milhões e não declarar à Receita Federal
Para quem não sabe, Agaciel Maia, secretário-geral do Senado, é irmão do deputado federal João Maia (PR) e primo do senador José Agripino Maia (DEM). Neste domingo, reportagem da Folha de São Paulo revela que Agaciel comprou uma casa no valor de R$ 5 milhões, na área nobre de Brasília, no nome do irmão-deputado. João Maia, por sua vez, não declarou o imóvel à Receita Federal nem à Justiça Eleitoral.
De acordo com a Folha, peritos da Receita Federal afirmaram que o caso pode representar "conluio" entre os dois para omissão de renda.
A reportagem também relata as muitas denúncias e suspeitas de irregularidades que pesam contra Agaciel Maia.
A Folha revela ainda que antes da eleição para a Presidência do Senado, os então candidatos Tião Viana (PT-AC) e Garibaldi Alves Filho (PMDB-RN) prometiam demitir Agaciel como forma de moralizar a Casa.
Como se sabe, Garibaldi desistiu da candidatura e Tião Viana terminou derrotado por José Sarney (PMDB-AP).
Há outro detalhe que a reportagem não menciona. O DEM de Agripino apoiou Sarney na eleição do Senado. Em troca, Sarney se comprometeu, como o fez de fato, a manter Agaciel exatamente no mesmo lugar. Foi Sarney, aliás, quem nomeou o primo de Agripino para o cargo de diretor-geral da Casa, em 1995.
Leia, a seguir, a íntegra da reportagem:
Servidor do Senado esconde casa de R$ 5 mi
Agaciel Maia, ordenador de despesas do Senado, registrou imóvel no nome do irmão deputado, que nunca declarou o bem
Agaciel diz que não pôs casa no nome dele porque estava com os bens indisponíveis devido ao escândalo da gráfica do Senado, em 1994
LEONARDO SOUZA
ADRIANO CEOLIN
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Há 14 anos como o "homem do cofre" do Senado, Agaciel Maia usou o irmão e deputado João Maia (PR-RN) para esconder da Justiça a propriedade de uma casa avaliada em cerca de R$ 5 milhões.
O imóvel está no nome do deputado, que não declarou o bem nem à Receita Federal nem à Justiça Eleitoral."Eu comprei [o imóvel], mas não podia pôr no meu nome porque eu estava com os bens indisponíveis. Então, na época, em vez de comprar no meu nome, eu comprei no nome do João", disse Agaciel à Folha.
Agaciel entrou no Congresso como datilógrafo no final da década de 1970. Galgou alguns postos desde então e tornou-se em 1995 o servidor mais poderoso do Senado. Foi nomeado naquele ano para o cargo de diretor-geral pelo então presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), eleito novamente para a função no último dia 2.
Agaciel é o ordenador de despesas do Senado. As contas da Casa precisam de sua assinatura para serem pagas, embora os gastos acima de R$ 80 mil necessitem do aval da Mesa Diretora, composta por sete senadores. Sob sua gestão, está previsto um orçamento para este ano de R$ 2,7 bilhões -maior, por exemplo, do que o da cidade de Porto Alegre.
Agaciel comprou a casa em 1996, um ano após assumir o cargo de diretor-geral, mas nunca registrou a propriedade. Não há nenhum imóvel em Brasília em seu nome, nem no de sua mulher, Sânzia, também funcionária do Senado, nem no nome dos três filhos do casal.
A casa tem 960 metros quadrados de área construída, com três andares, cinco suítes e salão de jogos. Localizada num dos pontos mais nobres de Brasília, às margens do lago Paranoá, no Lago Sul, dispõe de uma piscina em forma de taça, um amplo campo de futebol e um pequeno píer para barcos e lanchas.
Aficionado por futebol, Agaciel costuma organizar partidas em seu campo aos sábados. Até 2007, antes de sofrer de dores na coluna, um dos frequentadores da pelada era o ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa, seu ex-colega da gráfica do Senado.
A indisponibilidade dos bens de Agaciel foi decretada pela Justiça na esteira do escândalo da gráfica, em 1994.
Naquele ano, o então senador Humberto Lucena (PMDB-PB) teve sua candidatura à reeleição cassada pela Justiça Eleitoral por uso ilegal da gráfica para impressão de material de campanha.
Também enfrentaram representação na Justiça Eleitoral, acusados da mesma prática, os políticos pelo então PFL maranhense Roseana Sarney (deputada e candidata vencedora a governadora) e os postulantes ao Senado Alexandre Costa e o hoje ministro de Minas e Energia, Edison Lobão. Eles tiveram cadernos escolares com propaganda eleitoral impressos na gráfica encomendados por Costa, candidato à reeleição.
Suas candidaturas, contudo, não foram cassadas.
Foi nessa época que Agaciel se aproximou da família Sarney. Ele era o diretor da gráfica quando o material foi impresso. Na ocasião, o Ministério Público Federal pediu que houvesse o ressarcimento dos gastos à União. Assim, foi determinado o bloqueio de seus bens (proibição de venda).
A casa foi adquirida em 1996 por meio de um termo de compra e venda, mas só foi registrada no cartório de imóveis -o que caracteriza legalmente a propriedade do bem- em 2002, e no nome de João Maia.
Segundo Agaciel, a indisponibilidade de seus bens foi suspensa entre 1999 e 2000. Ele afirma que sempre informou a casa à Receita, mas só mostrou à reportagem sua declaração de 2001 -primeiro ano após a suspensão da indisponibilidade dos bens.
Auditores da Receita disseram que o caso pode representar "conluio" entre os dois para omissão de renda, mas ressaltaram que só uma análise detalhada das declarações de bens e das movimentações bancárias permitiria uma afirmação de irregularidade ou fraude fiscal. No caso de Agaciel, como não colocou o imóvel em seu nome, se fosse condenado, a casa não poderia ser penhorada.
Ex-candidatos já prometeram demitir Agaciel
Semanas antes da eleição para a Presidência do Senado, os então postulantes ao cargo Tião Viana (PT-AC) e Garibaldi Alves (PMDB-RN) diziam nos bastidores que, se vencessem, iniciariam uma campanha de moralização da Casa, começando pela demissão de Agaciel Maia.
A trajetória de Agaciel no Senado, seja no comando da gráfica ou na direção geral, é marcada por uma série de denúncias e suspeitas de irregularidades.
Potiguar de Jardim de Piranhas, Agaciel, 51, teve seu primeiro envolvimento num escândalo de maiores proporções em 1993, como diretor-executivo da gráfica. Agaciel foi acusado de desviar recursos provenientes de trabalhos realizados pela gráfica, mas nada foi comprovado contra ele.
No ano seguinte, Agaciel teve seus bens bloqueados pela Justiça por conta de outro caso, que resultou na cassação da candidatura de reeleição do senador Humberto Lucena (PMDB-PB). Segundo a Justiça eleitoral, Lucena imprimiu material de campanha na gráfica da Casa.
Em 1995, Agaciel foi nomeado diretor-geral da Casa. Em 1999, a mulher dele, Sânzia Maia, foi nomeada para a Secretaria de Estágios.
Ela só deixou o cargo no ano passado, após a edição da súmula do STF (Supremo Tribunal Federal) que proibiu o nepotismo em todo o serviço público.
Em 2005, Agaciel virou réu numa ação por improbidade movida pelo Ministério Público Federal, que o acusou de ter permitido três aditivos ilegais no valor total de R$ 984 mil, sem licitação, ao contrato de compra da "sala cofre" para o Prodasen (área de processamento de dados do Senado). Esse processo encontra-se parado na Justiça Federal.
Em 2006, a gestão de Agaciel sofreu outro baque ao ser atingida pela Operação Mão-de-Obra da Polícia Federal, que investigou fraudes em licitações para a contratação de empresas terceirizadas. Os policiais chegaram a realizar uma ação de busca e apreensão no Senado.
No entanto, horas antes, o então presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), pediu para Agaciel receber os policiais federais. No mesmo dia, o Ministério Público Federal acusou a PF de vazar informações sigilosas da operação.
No ano passado, o Ministério Público denunciou por improbidade três servidores do Senado, entre os quais Aloysio Brito Vieira e Dimitrios Hadjinicolaou, ambos homens de confiança de Agaciel. O processo está em andamento.
O diretor-geral, porém, acabou não sendo denunciado pelos procuradores.
Agaciel diz que tem renda para comprar casa
O diretor-geral do Senado, Agaciel Maia, diz que ele e sua mulher, Sânzia Maia, têm renda suficiente para ter a casa e alega que só não cumpriu uma formalidade, de registrar a propriedade em seu nome no registro de imóveis.
Segundo ele, os dois recebem líquidos por mês cerca de R$ 18 mil e R$ 14 mil, respectivamente. Mas Agaciel não informou sua renda em 1996, quando comprou o imóvel.
Supondo que a casa fosse adquirida hoje, pelo valor médio de R$ 5 milhões estimado por três corretores de imóveis ouvidos pela Folha, Agaciel e Sânzia teriam de ter economizado integralmente por mais de 12 anos, mantidas suas remunerações atuais. O valor do imóvel calculado pelos corretores foi de R$ 3,5 milhões a R$ 7 milhões. Há vários anúncios de casas na região da propriedade nessa faixa de preço.
Agaciel apresentou à Folha parte de sua declaração de Imposto de Renda de 2001, na qual consta a casa entre seus bens. Mas não apresentou a de 1997, ano posterior à compra.
O deputado João Maia (PR-RN) disse que, como o imóvel pertence a Agaciel, era obrigação de seu irmão declará-lo ao fisco. "Foi tudo feito às claras, não tem nenhuma ilegalidade, não há nada de errado na transação", disse o deputado.
Há, contudo, divergências nas versões apresentadas por Agaciel e seu irmão. O imóvel foi registrado em 2002 por R$ 180 mil. Segundo a avaliação dos corretores ouvidos pela Folha, só o terreno naquele ano valia cerca de R$ 1 milhão.
Agaciel disse que o valor a ser considerado é o de 1996 e que, na época da compra, o imóvel era um terreno cheio de mato com uma casa inacabada. Naquele mesmo ano ele vendeu no mesmo bairro, no interior da QL 8, uma casa por R$ 418 mil. Um imóvel na beira do lago costuma ser muito mais caro do que no interior de quadra.
Já João Maia disse se lembrar "perfeitamente" que ele comprou a casa na beira do lago por "uns R$ 470 mil", "mais ou menos" o mesmo valor da casa vendida.
Em relação à origem do dinheiro, primeiro Agaciel disse que vendeu a casa da QL 8 para comprar o imóvel no lago. Porém a venda do imóvel na QL 8 só ocorreu dois meses depois da compra da casa na QL 6. Ao ser questionado pela reportagem sobre essa diferença de datas, ele disse que seu irmão lhe emprestou o dinheiro e que depois, com a venda da primeira casa, ele pagou a dívida.
João Maia confirmou a versão do empréstimo.
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