sábado, 24 de março de 2007

Rede pública paga quase igual à particular

De ANTÔNIO GOIS na Folha de S.Paulo, hoje:

"Um estudo que será divulgado na segunda-feira contesta um dos mitos mais disseminados da educação brasileira: o de que o ensino público vai mal quando comparado ao particular por causa dos baixos salários dos professores.

Feito pelos pesquisadores Samuel Pessoa, Fernando de Holanda Barbosa Filho e Luís Eduardo Afonso, da FGV e da USP, o trabalho mostra que a renda média de professores da rede privada é quase a mesma dos seus colegas da rede pública. A diferença não passa de 11%, no caso dos que trabalham no ensino médio.

No entanto, se forem considerados os benefícios da aposentadoria no setor público, a situação se inverte em favor dos professores estaduais, municipais e federais.

O estudo será apresentado no seminário Remuneração do Professor, Gestão e Qualidade da Educação, realizado pela Fundação Lemann, pelo Instituto Futuro Brasil (IFB) e pelo Ibmec para discutir as causas do fracasso do ensino público.

No Saeb (exame do MEC que avalia a qualidade da educação básica), os resultados da rede privada no 3º ano do ensino médio são significativamente superiores aos da rede pública.

Numa escala de 0 a 500, as médias na rede privada foram de 307 pontos em matemática e 333 em português. No setor público, elas caem, respectivamente, para 249 e 260.

O Enem (outro exame do MEC restrito ao ensino médio) mostra o mesmo quadro. De 0 a 100, a média nas escolas particulares foi de 52,7, enquanto nas públicas ficou em 39,5.

Essa diferença de desempenho, para os autores do estudo, tem muito pouco ou nada a ver com o salário dos professores. Para chegar a essa conclusão, eles compararam pelo Censo 2000 do IBGE a renda média de professores da rede pública com os da rede privada em todos os níveis de ensino.

Levando em conta apenas a renda, a diferença a favor da rede privada variou apenas de 4,9% no caso da pré-escola para 11% no caso do ensino médio.

Os autores do estudo, no entanto, ampliaram essa análise levando em conta também o regime de contribuição previdenciária e aposentadoria em cada rede. Ao fazer isso, perceberam que os rendimentos pagos na rede pública são melhores do que os da rede privada se, nessa análise, forem considerados os descontos que os trabalhadores fazem para contribuir para a previdência e o valor dos rendimentos após aposentados."

Não conheço os números que serviram de base para o estudo feito pelos pesquisadores da FGV e da USP. Portanto, não tenho como contestá-los.

Entretanto, conheço a realidade dos professores aqui do Rio Grande do Norte.

E posso assegurar que a diferença de remuneração entre os docentes da rede pública e das escolas privadas é bem maior pelas bandas de cá.

O salário base de um professor estadual aqui no RN é de pouco mais de R$ 400,00.

Mas concordo que isso não pode servir de desculpa para o caos do ensino público.

Há professores despreparados nas salas de aula.

Há professores preguiçosos que empurram as coisas com a barriga, não se atualizam, não mudam a "fórmula" das aulas.

Há professores que fazem de conta que ensinam, enquanto os alunos fazem de conta que aprendem.

Há professores que se acham donos absolutos da verdade, do conhecimento, do saber. Nunca admitem o próprio erro, nunca voltam atrás, nunca ouvem a opinão dos alunos.

Há professores que descarregam frustrações pessoais e profissionais em cima dos alunos.

E...

Há alunos que vão à escola em busca apenas de notas.

Há alunos que chegam ao ensino médio sem saber ler nem escrever corretamente.

Há alunos que nunca leram um livro na vida.

Há alunos que saem da escola, chegam em casa e correm pra assistir programas educativos como "Patrulha da Cidade", "Caso de Polícia", "Malhação", esquecendo cadernos e livros num canto qualquer da casa.

Há alunos que até querem estudar de verdade, aprender algo além de fórmulas e conceitos prontos.

Mas...

Falta o que comer em casa.

Falta dinheiro para pagar a passagem e ir à escola.

Faltam livros, bibliotecas, internet.

Falta dignidade: há crianças, adolescentes e jovens vítimas de abuso sexual, violência doméstica, trabalho escravo.

Certa vez, uma aluna chegou até mim e disse-me: "Professor, amanhã não virei à aula porque vou fazer uma faxina pra ganhar algum dinheiro... lá em casa não tem mais o que comer".

Outra vez, outra aluna contou-me que não iria mais às aulas do curso profissionalizante porque seu pai achava que ela saia de casa para se prostituir (ela era uma das melhores alunas e conseguiu um estágio numa grande empresa da cidade).

Numa tarde, fui surpreendido pelo depoimento de um aluno que voltara a assitir as aulas depois de um longo tempo sumido. Ele confessou-me que andara praticando alguns assaltos à mão armada: celulares, bolsas etc. Mas havia colocado a cabeça no lugar e decidira lutar por um futuro melhor.

Ele ficou com medo da minha reação. Achava que eu iria persegui-lo.

O rapaz também foi encaminhado a um estágio. Hoje, prepara-se para o vestibular. Ele quer ser administrador de empresas.

Há professores que não se interessam pela história de seus alunos.

Há escolas que se parecem mais com centros de repressão, quando deveriam ser centros de esperança.

Há escolas desconectadas da realidade.

Há escolas tristes, escuras, feias... escolas que não simbolizam nada de bom... escolas que não sugerem nenhuma mudança de vida... escolas que não servem de estímulo.

E há quem não enxergue nada disso...

Enquanto houver professores, alunos e escolas assim, a educação continuará um caos.

Um comentário:

Paróquias Anglicanas em Natal disse...

Em parte concordo que muitas escolas privadas pagam até menos que as públicas....
Mas aqui em Natal por exemplo as escolas tradicionais pagam duas vezes mais e dão condições do professor fazer um bom trabalho com todos os recursos disponíveis...
Digo isso mais estudei na melhor escola pública do Estado : ETFRN/CEFET!