Fiquei de longe só acompanhando a repercussão do caso da RCTV da Venezuela - a emissora que teve a sua concessão não renovada pelo presidente Hugo Chávez.
O artigo de Marcelo Salles do "Fazendo Média" traduz o que eu penso sobre o episódio e seus significados.
A mídia tupiniquim adotou o tom que já era esperado: acusaram Chávez de "ditador" e disseram que a "cassação" (quando o correto seria dizer "não-renovação") da concessão da RCTV representava um "golpe" contra a liberdade de imprensa. Alguém esperava que por aqui se dissesse outra coisa?
Não se disse que a RCTV participou ativamente do golpe fracassado, em abril de 2002, contra Chávez. A Folha referiu-se ao episódio como uma simples "tentativa de golpe".
Esse episódio é revelador da luta que se trava em torno do domínio da mídia - um bem público, mas que é regido pelo interesse privado.
Marcelo Salles escreve acertadamente que "quem controla a subjetividade, controla a hegemonia". Ele acrescenta que "os meios de comunicação de massa constituem a instituição com maior poder de produzir subjetividades".
Na Carta Capital desta semana, a matéria de capa ("A mídia faz política") traz um levantamento dos casos recentes na história da América Latina nos quais a mídia jogou do lado obscuro, ignorando as agora invocadas regras democráticas, aliando-se à golpistas.
"Foi o que aconteceu no Brasil, na preparação do golpe de 1964, ou no Chile, em 1973, quando os militares derrubaram o governo de Salvador Allende", escreve o repórter Giancarlo Summa.
Carta Capital mostra o que está em jogo: a mídia se transformou em um dos mais fortes "poderes de fato" da América Latina. A conclusão é apontada pelo relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) de 2004, no capítulo "Democracia na América Latina".
Segundo os dados do relatório, expostos por Carta Capital, para a maioria das lideranças entrevistadas do continente, o verdadeiro poder é exercido, atualmente, não pelos governos ou partidos, mas pelos grupos econômicos e finaceiros em primeiro lugar (79,7% das respostas) e, em segundo lugar, pelos meios de comunicação (65,2%).
Ou seja, a briga é por poder e hegemonia - democracia é só pretexto. Chávez atingiu o coração do leão.
Por aqui produziu-se ainda outro episódio curioso sobre essa questão venezuelana. Na quarta-feira 30, o Senado brasileiro aprovou um requerimento do senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) pedindo que o presidente Chávez devolvesse a concessão da RCTV.
Em resposta à intromissão brasileira em um assunto interno de seu país, Chávez retrucou acusando o Congresso brasileiro de estar a serviço do governo de Washington. Segundo a Folha de S. Paulo, Chávez disse que o Senado do Brasil agia como "papagaio" do Congresso americano.
"O Congresso do Brasil deveria se preocupar com os problemas do Brasil. O Congresso é dominado pelos movimentos e partidos da direita, que estão tentando que a Venezuela não entre no Mercosul."
Ainda segundo a Folha, Chávez disse que "é muito mais fácil que o império português [volte] a se instalar em Brasília do que o governo da Venezuela devolver a concessão à oligarquia venezuelana".
Depois vieram as repercussões à fala de Chávez. Representantes do governo e da oposiçao no Senado e na Câmara disseram que o preseidente venezuelano desrespeitou o Congresso brasileiro. Aí, em seguida, os adjetivos de praxe: "aprendiz de ditador", "tirano", "desorientado" etc.
O presidente Lula divulgou nota na sexta-feira 1, repudiando as críticas de Chávez e cobrando explicações do embaixador da Venezuela no Brasil.
Para o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Celso Amorim, as declarações de Chávez causam "incômodo ou preocupação".
Neste sábado 2, Chávez disse que suas críticas ao Congresso brasileiro foram motivadas pelo "comunicado grosseiro" que o Senado emitiu, quando aprovou o tal requerimento pedindo que ele devolvesse a concessão da RCTV.
"O Congresso do Brasil emitiu um comunicado grosseiro que me obrigou a respondê-lo. Não aceitamos a ingerência de ninguém em nossos assuntos internos", disse Hugo Chávez, discursando para milhares de apoiadores do seu governo que marcharam hoje em Caracas, apoiando a não-renovação do contrato da RCTV.
Em outro trecho do seu discurso, Chávez mandou aqueles que o criticam por não renovar a concessão do canal RCTV "para o inferno".
"Vão para o inferno, representantes da oligarquia internacional. Nós mandamos vocês para o inferno daqui da ruas da liberdade, pelo povo livre da Venezuela", disse Chávez inflamado.
Triste é ver a posição do governo brasileiro nessa história toda.
É claro que o Congresso Nacional não tinha nada que aprovar requerimento nenhum para enviar ao presidente venezuelano.
Chávez não mentiu uma vírgula.
A reação dos senadores, posteriormente dos deputados federais, amplificada pela mídia, é a reação do rato com medo da ratoeira.
No Brasil, a Constituição proíbe que políticos e parentes próximos sejam proprietários de concessões de rádio e TV. Até o reino mineral sabe que o que mais tem por aqui é político dono de emissoras de rádio e televisão: José Sarney, Antônio Carlos Magalhães, José Agripino, só pra citar alguns exemplos.
Eles vão lá concordar que mexam no queijo deles?
Queria que Lula tivesse peito e fizesse o mesmo que Chávez fez: mandasse os críticos para o inferno e começasse não renovando as concessões de televisão que pertencem aos políticos brasileiros.
Acho que vou morrer e não vejo isso acontecer.
Quando o governo é acuado, Lula e o PT acusam a mídia de golpista. Mas nem Lula nem o PT têm coragem de abrir a caixa-preta das concessões de televisão no Brasil.
O artigo de Marcelo Salles do "Fazendo Média" traduz o que eu penso sobre o episódio e seus significados.
A mídia tupiniquim adotou o tom que já era esperado: acusaram Chávez de "ditador" e disseram que a "cassação" (quando o correto seria dizer "não-renovação") da concessão da RCTV representava um "golpe" contra a liberdade de imprensa. Alguém esperava que por aqui se dissesse outra coisa?
Não se disse que a RCTV participou ativamente do golpe fracassado, em abril de 2002, contra Chávez. A Folha referiu-se ao episódio como uma simples "tentativa de golpe".
Esse episódio é revelador da luta que se trava em torno do domínio da mídia - um bem público, mas que é regido pelo interesse privado.
Marcelo Salles escreve acertadamente que "quem controla a subjetividade, controla a hegemonia". Ele acrescenta que "os meios de comunicação de massa constituem a instituição com maior poder de produzir subjetividades".
Na Carta Capital desta semana, a matéria de capa ("A mídia faz política") traz um levantamento dos casos recentes na história da América Latina nos quais a mídia jogou do lado obscuro, ignorando as agora invocadas regras democráticas, aliando-se à golpistas.
"Foi o que aconteceu no Brasil, na preparação do golpe de 1964, ou no Chile, em 1973, quando os militares derrubaram o governo de Salvador Allende", escreve o repórter Giancarlo Summa.
Carta Capital mostra o que está em jogo: a mídia se transformou em um dos mais fortes "poderes de fato" da América Latina. A conclusão é apontada pelo relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) de 2004, no capítulo "Democracia na América Latina".
Segundo os dados do relatório, expostos por Carta Capital, para a maioria das lideranças entrevistadas do continente, o verdadeiro poder é exercido, atualmente, não pelos governos ou partidos, mas pelos grupos econômicos e finaceiros em primeiro lugar (79,7% das respostas) e, em segundo lugar, pelos meios de comunicação (65,2%).
Ou seja, a briga é por poder e hegemonia - democracia é só pretexto. Chávez atingiu o coração do leão.
Por aqui produziu-se ainda outro episódio curioso sobre essa questão venezuelana. Na quarta-feira 30, o Senado brasileiro aprovou um requerimento do senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG) pedindo que o presidente Chávez devolvesse a concessão da RCTV.
Em resposta à intromissão brasileira em um assunto interno de seu país, Chávez retrucou acusando o Congresso brasileiro de estar a serviço do governo de Washington. Segundo a Folha de S. Paulo, Chávez disse que o Senado do Brasil agia como "papagaio" do Congresso americano.
"O Congresso do Brasil deveria se preocupar com os problemas do Brasil. O Congresso é dominado pelos movimentos e partidos da direita, que estão tentando que a Venezuela não entre no Mercosul."
Ainda segundo a Folha, Chávez disse que "é muito mais fácil que o império português [volte] a se instalar em Brasília do que o governo da Venezuela devolver a concessão à oligarquia venezuelana".
Depois vieram as repercussões à fala de Chávez. Representantes do governo e da oposiçao no Senado e na Câmara disseram que o preseidente venezuelano desrespeitou o Congresso brasileiro. Aí, em seguida, os adjetivos de praxe: "aprendiz de ditador", "tirano", "desorientado" etc.
O presidente Lula divulgou nota na sexta-feira 1, repudiando as críticas de Chávez e cobrando explicações do embaixador da Venezuela no Brasil.
Para o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Celso Amorim, as declarações de Chávez causam "incômodo ou preocupação".
Neste sábado 2, Chávez disse que suas críticas ao Congresso brasileiro foram motivadas pelo "comunicado grosseiro" que o Senado emitiu, quando aprovou o tal requerimento pedindo que ele devolvesse a concessão da RCTV.
"O Congresso do Brasil emitiu um comunicado grosseiro que me obrigou a respondê-lo. Não aceitamos a ingerência de ninguém em nossos assuntos internos", disse Hugo Chávez, discursando para milhares de apoiadores do seu governo que marcharam hoje em Caracas, apoiando a não-renovação do contrato da RCTV.
Em outro trecho do seu discurso, Chávez mandou aqueles que o criticam por não renovar a concessão do canal RCTV "para o inferno".
"Vão para o inferno, representantes da oligarquia internacional. Nós mandamos vocês para o inferno daqui da ruas da liberdade, pelo povo livre da Venezuela", disse Chávez inflamado.
Triste é ver a posição do governo brasileiro nessa história toda.
É claro que o Congresso Nacional não tinha nada que aprovar requerimento nenhum para enviar ao presidente venezuelano.
Chávez não mentiu uma vírgula.
A reação dos senadores, posteriormente dos deputados federais, amplificada pela mídia, é a reação do rato com medo da ratoeira.
No Brasil, a Constituição proíbe que políticos e parentes próximos sejam proprietários de concessões de rádio e TV. Até o reino mineral sabe que o que mais tem por aqui é político dono de emissoras de rádio e televisão: José Sarney, Antônio Carlos Magalhães, José Agripino, só pra citar alguns exemplos.
Eles vão lá concordar que mexam no queijo deles?
Queria que Lula tivesse peito e fizesse o mesmo que Chávez fez: mandasse os críticos para o inferno e começasse não renovando as concessões de televisão que pertencem aos políticos brasileiros.
Acho que vou morrer e não vejo isso acontecer.
Quando o governo é acuado, Lula e o PT acusam a mídia de golpista. Mas nem Lula nem o PT têm coragem de abrir a caixa-preta das concessões de televisão no Brasil.
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