Com a RCTV, cai também boa parte da credibilidade das corporações da mídia em todo o mundo. Seja a CNN, que falsificou imagens de protestos; sejam as agências de notícias ligadas a Washington ou as emissoras privadas da América Latina, que apoiaram o golpe na Venezuela em 2002. No Brasil, o ímpeto contra Hugo Chávez já coleciona distorções, meias verdades e mentiras inteiras.
Por exemplo, a primeira página da Folha de S. Paulo desta quarta-feira (30) registra que a concessão da RCTV foi "cassada" por Hugo Chávez. Não é verdade. A concessão terminou e não foi renovada; ela não foi cassada. A TV Globo, por sua vez, em praticamente todos os seus telejornais dá a entender que o governo venezuelano fechou a emissora arbitrariamente, comprometendo a liberdade de imprensa e a democracia.
Os demais veículos corporativos seguem pelo mesmo caminho. Com alguma dificuldade, assumem que houve um golpe de Estado contra Chávez, em abril de 2002. Mas, do jeito que noticiam, fica parecendo que o golpe surgiu por geração espontânea. Não apontam responsáveis, embora os conheçam. Não revelam a participação da CIA, embora existam provas fartas. Não oferecem, sequer, a versão do outro lado, conforme ensinam seus próprios manuais de redação. Naquela sexta-feira, 11 de abril de 2002, Arnaldo Jabor comemorou o golpe contra Chávez atirando bananas para o alto, em seu comentário para o Jornal Nacional. A revista Veja também ficou satisfeita: "cai o presidente falastrão", disse sua edição daquele final de semana.
Mas o que está por trás da atual campanha contra Hugo Chávez não é nem o presidente venezuelano em si. É também, mas vai além dele. Atravessa-o. O que está em jogo é o controle de um bem público que confere um poder nunca antes sonhado pelas elites. Hoje, na Era da Informação, o poder de produzir e transmitir imagens e palavras é a premissa básica para se alcançar todas as riquezas imagináveis.
Aquilo que os exploradores de hoje perceberam há pelo menos cinqüenta anos, só recentemente os movimentos sociais começaram a entender. O ponto chave é: quem controla a subjetividade, controla a hegemonia. Os meios de comunicação de massa constituem a instituição com maior poder de produzir subjetividades. Através de suas mensagens, determinam formas de pensar, agir, sentir e viver de toda uma comunidade, região ou país.
É por isso que as corporações da mídia, a serviço da exploração dos povos, articulam uma campanha sem precedentes contra Hugo Chávez. Porque ao não renovar a concessão de uma dessas corporações e, além disso, conceder seu controle a grupos populares, Chávez atinge substancialmente a fonte de poder daquelas corporações. Por isso o dia da não renovação da concessão da RCTV, 27 de maio de 2007, será lembrado como um grande avanço na história da humanidade.
A TV Globo, que apoiou a ditadura que seqüestrou, torturou e assassinou milhares de brasileiros - repito, milhares de brasileiros - agora acusa Hugo Chávez de violar a liberdade de imprensa. A Folha de S. Paulo, que emprestou automóveis para órgão da repressão, agora acusa Chávez de agredir a democracia. Estão desesperados. Porque o governo venezuelano abriu um precedente perigosíssimo para as classes exploradoras, mas belíssimo para todos que acreditam numa humanidade mais humana.
Neste mês de maio, vencem dezenas de outorgas de rádio e televisão no Brasil. São cinco da Globo, duas da Bandeirantes e uma da Record, sem contar as emissoras afiliadas. O levantamento foi feito pelo Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação e pode ser lido aqui.
Em junho do ano passado, em plena Copa do Mundo, o presidente Lula assinou um decreto ilegal entregando novas concessões públicas de televisão digital para as mesmas empresas que já transmitem em sinal analógico. Se os movimentos sociais não quiserem continuar sendo massacrados pelas corporações de mídia, a hora de agir é agora. É preciso compreender a importância histórica desse momento e ir para as ruas. Movimento Negro, MST, MTST, Marcha das Mulheres, Estudantes acampados na USP e em outras universidades, professores, sindicatos, todos, sem exceção, precisam ir para as ruas e, mais que pressionar, precisam obrigar nossos representantes a não renovarem essas concessões e a anularem o decreto da televisão digital.
O que está acontecendo na Venezuela não é um ato isolado. São as conseqüências da falência das políticas neoliberais, que concentram as riquezas em poucas mãos e distribuem a miséria para a maioria. É possível reverter esse quadro, como o governo venezuelano está mostrando. Até porque o fracasso desse modelo derruba também a credibilidade de seus interlocutores, ou seja, das corporações da mídia. E um dos momentos mais lindos da história humana é quando os oprimidos deixam de acreditar nas palavras dos exploradores e se levantam, sem medo, dispostos a enfrentá-los.
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