A erotização feminina na mídia
Por Ligia Martins de Almeida, no Observatório da Imprensa, em 6/3/2007:
"Na semana em que a mídia começa a falar do Dia Internacional da Mulher, com as tradicionais matérias sobre a história do feminismo, perfis e entrevistas com feministas, mostrando como a situação da mulher evoluiu – e melhorou – desde o surgimento do movimento, na década de 1960 –, a American Psychological Association (APA) liberou um estudo que poderia render boas matérias sobre a imagem da mulher na mídia.
O estudo, divulgado pelo Washington Post no artigo "Adeus à infância", mostra que as meninas norte-americanas estão cada vez mais sendo alimentadas por uma imensidão de produtos e imagens que promovem looks e atitudes sensuais:
"Na cultura americana, e especialmente na mídia, mulheres e meninas são mostradas sempre de uma maneira erotizada. Os autores do estudo dizem que essas imagens são encontradas em toda a mídia, de shows de TV a revistas, de vídeos musicais à internet. Embora poucas pesquisas tenham documentado o efeito dessas imagens especificamente em meninas, os autores do estudo da APA argumentam que é razoável inferir que algum dano seja provocado nas meninas de 18 anos ou mais. A erotização tem sido ligada a três dos mais comuns problemas de saúde mental de adolescentes e mulheres adultas: desordens alimentares, baixa auto-estima e depressão." (Washington Post, 20/2/2007)
Nova postura
Segundo o jornal, o processo nas meninas começa cada vez mais cedo, pela própria mensagem que elas recebem: "É normal que você tenha interesse em sexo. É normal você se vestir e agir de maneira sensual". As mães entrevistadas não vêem problemas para suas filhas, alegando que no mundo de hoje é importante querer se manter bonita, já que a beleza é parte fundamental no sucesso profissional. E alegam que são as filhas que escolhem os modelos de roupas e acessórios desde a primeira infância. As mães que não concordam com os modelitos infantis sensualizados confessam ter problemas ao procurar, no comércio, roupas mais tradicionais – ou menos sensuais – para suas filhas de 4, 5 ou 6 anos.
O que o jornal americano não discute – e que poderia ser discutido pela mídia brasileira – é justamente a parcela de culpa da mídia nessa erotização da imagem da mulher. Quer um exemplo? A revista Veja desta semana (nº 1998, de 7/3/2007) traz um especial sobre saúde ("A medicina revela a mulher de verdade"), ressaltando as diferenças entre o corpo do homem e o corpo da mulher, e mostra que – por razões econômicas e culturais – até muito pouco tempo atrás as pesquisas médicas se baseavam apenas na fisiologia masculina para desenvolver medicamentos.
A revista atribui, entre outros fatores, à igualdade conquistada pelas mulheres o fato da nova postura das pesquisas em relação à saúde. E, para ilustrar a matéria, as fotos são de uma mulher. Bonita e... nua.
Crianças vão ocupar o lugar
Uma foto que, nos dias de hoje, não espanta ninguém. Afinal, o corpo feminino (adulto) exposto na mídia virou coisa banal. Como rende belas fotos e ilustrações, e como as modelos são adultas, conscientes e remuneradas, ficam todos felizes. O perigo é que a idade das modelos foi diminuindo e, hoje, meninas de 12 anos, que nas fotos parecem adultas, tornaram as modelos de 20 e poucos anos ultrapassadas. Não demora muito e o lugar delas vai ser tomado por meninas cada vez mais jovens e cada vez mais erotizadas.
Não seria o caso de, nesse Dia Internacional da Mulher, usar o espaço destinado à história do feminismo para discutir o que está acontecendo hoje com as mulheres? No perfil do jornal O Estado de S.Paulo, Rose Marie Muraro, "a patrona do feminismo brasileiro", ganhou poucas linhas para falar de sua luta atual: o fim da violência doméstica de que são vítimas as mulheres rurais. E para dizer que, felizmente, hoje a violência contra mulheres é crime inafiançável. Ela teria muito mais a dizer se a imprensa tivesse interesse em discutir a causa feminina em profundidade.
Seria interessante descobrir como as feministas vêem a exposição feminina na mídia nos dias correntes. Porque uma coisa é certa: não foi para transformar as mulheres em objeto de consumo que o movimento feminista lutou pela igualdade feminina. Menos ainda para ter a imagem feminina tratada da forma como é vista na mídia atual. E, se nada for feito, em muito pouco tempo serão as crianças que vão ocupar esse nada honroso lugar na mídia."
Um comentário:
Parabéns Alisson, é esse tipo de discussão à cerca do posicionamento da mulher e de seus interesses sociais e jurídicos que devem ser travados na atualidade. Chega de lembrar dos movimentos iniciais de luta do feminismo, com lendas urbanas de mulheres queimando sutiãs(o que nunca foi provado, realmente!).É preciso atentar para a maior arma da mulher na atualidade, o conhecimento de seus direitos como cidadã brasileira.Inibindo, assim, ofensas e agressões masculinas de todas as espécies, sejam advindas da própria família, dos meios de comunicação ou do mercado de trabalho.
A mudança de foco e quebra de paradigma trarão a real igualdade de direitos.
E só a partir desse momento teremos motivos suficientes para comemorar!
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